Cido Sério, ex-prefeito de Araçatuba, acusado de desvios

A Justiça Federal instaurou ação penal contra o ex-prefeito de Araçatuba (SP) Aparecido Sério da Silva e três ex-secretários municipais envolvidos em um desvio milionário de verbas públicas durante convênios firmados com a Associação para Valorização de Pessoas com Deficiência (Avape) entre 2009 e 2014.

O presidente da entidade também vai responder pelos crimes. Os cinco foram denunciados pelo Ministério Público Federal em 2016, quando Aparecido ainda estava no cargo. O esquema causou prejuízo de pelo menos R$ 16,7 milhões aos cofres públicos.


As investigações mostraram que a escolha da Avape para atuação nos setores de saúde pública e assistência social do município foi direcionada e envolveu diversas irregularidades. Inicialmente, houve inércia deliberada dos gestores que, mesmo sabendo com antecedência do término da parceria anterior, criaram uma situação de urgência para a nova contratação. 

CRIMES

Os cinco envolvidos vão responder por apropriar-se de rendas públicas ou desviá-las em proveito alheio, conforme previsto no art. 1º, I, do Decreto-Lei nº 201/67. Além de Aparecido Sério da Silva, prefeito de Araçatuba entre 2009 e 2016, são réus no processo os ex-secretários Aparecida Severiano Lacerda e Silva, da pasta de Ação Social, Márcio Chaves Pires, secretário de Governo e Gestão Estratégica à época, e Osmar Aparecido Cuoghi, da área de Saúde e Higiene Pública. Completa o quadro de denunciados o presidente da Avape, Marcos Antônio Gonçalves.


O MPF requer a condenação dos réus, bem como que todos fiquem proibidos de exercer cargo ou função pública por cinco anos. A denúncia pede ainda que os envolvidos paguem indenização de R$ 16,7 milhões pelos danos aos cofres públicos, valor que deverá ser atualizado a partir da data dos fatos. O número do processo é 0001440-33.2014.4.03.6107. Para consultar a tramitação, acesse http://www.jfsp.jus.br/foruns-federais/

A denúncia do MPF, de autoria das procuradoras regionais da República Elaine Cristina de Sá Proença e Rose Santa Rosa, foi ajuizada em novembro de 2016 no Tribunal Regional Federal da 3ª Região, em virtude do foro por prerrogativa de função do então prefeito de Araçatuba. Após a saída de Aparecido Sério da Silva do cargo, o processo foi remetido à Justiça Federal em 1ª instância, que intimou todos os acusados a apresentarem defesa antes de decidir pela instauração da ação penal.

Em abril de 2009, o concurso de projetos que seria aberto visando à seleção de uma Oscip para a prestação dos serviços teve seu início adiado de forma injustificada. Os termos de parceria com a Avape acabaram sendo firmados 14 dias antes da abertura do certame, depois que a Câmara de Araçatuba aprovou o projeto de lei enviado pela Prefeitura sobre a celebração dos convênios.

Como resultado, o processo seletivo foi revogado. Além de inviabilizar a participação de outras entidades, a contratação foi feita sem avaliar a capacidade técnica e operacional da associação para a efetivação dos serviços propostos. A Avape não tinha experiência de atuação nas áreas de saúde e assistência social, figurando, na prática, como intermediária de subcontratações de recursos humanos e materiais. 

“Os convênios, na verdade, foram contratos administrativos onerosos celebrados entre a entidade e o município, cujos objetivos eram, nada menos, que a terceirização da saúde e da assistência social naquela municipalidade”, destaca a denúncia do MPF.

A suposta parceria para desenvolvimento, operacionalização e gestão de programas e serviços na rede de saúde pública de Araçatuba foi inicialmente prevista para 12 meses, sob o custo de R$ 25,6 milhões. Contudo, foram celebrados seis termos aditivos que prorrogaram o vínculo até abril de 2014. O mesmo aconteceu com o convênio voltado à atuação na rede de proteção social. Com os aditamentos, a Avape recebeu mais R$ 130 milhões em verbas públicas no período.

Os acordos foram firmados sem a identificação clara do objeto contratado, das metas a serem atingidas, das etapas de execução e do plano de aplicação dos recursos. “Trata-se de lacunas dolosamente deixadas pelos denunciados com a nítida pretensão de prejudicar o controle de seus atos, facilitando o desvio de elevado montante de recursos”, afirma o MPF. Segundo as investigações, houve desfalque de ao menos R$ 16,7 milhões por meio de pagamentos de despesas não previstas em contrato e de serviços cuja execução não foi comprovada, além de superfaturamento e remuneração imprópria da associação, entre outras irregularidades.

A Avape recebeu indevidamente pelo menos R$ 12,8 milhões, sob a denominação de “Apoio Operacional e Logístico”. A despesa, não prevista em contrato e não comprovada na prestação de contas, representava cerca de 10% do valor dos convênios. O percentual fixo indica que se tratava de uma taxa administrativa para a remuneração da entidade e de seus dirigentes, o que é vedado pela legislação. Pagamentos indevidos também foram feitos por serviços de assessoria e consultoria, tarifas bancárias e para remuneração extra do quadro de pessoal da Avape. A prestação de contas inclui até honorários advocatícios em processo não relacionado ao convênio.

Foram identificados ainda pagamentos em duplicidade, o superfaturamento dos valores gastos com a reforma da UBS Raimunda Souza Martinez e o recrutamento de médicos plantonistas, objeto incluído no convênio sem aprovação formal da Secretaria Municipal de Saúde. Na lista de irregularidades constam também a contratação de empresa para treinamentos e cursos que na verdade foram ministrados por funcionários do município e da Avape, bem como prejuízo superior a R$ 500 mil com o aluguel de carros, que eram disponibilizados 24 horas para funcionários municipais, sem limite de quilometragem, em detrimento do Programa de Saúde da Família, que necessitava realizar visitas e consultas em residências. A apuração mostrou que a aquisição e incorporação dos veículos ao patrimônio público representaria gasto muito menor que o aluguel.