Colunista | Espaço do Egresso Unimar

A frase, de Luther King, pode nos ajudar a defender a democracia, pois é o caminho para a defesa dos direitos dos cidadãos

Uma concepção vem sobrevivendo desde Tucídides, passando por Maquiavel e Hegel, até Sartre e Matus. A concepção de que toda sociedade é conflituosa, isto é, de que sempre que houver uma comunidade de pessoas vivendo em conjunto, haverá conflitos entre elas. Um dos motivos é que todos queremos realizar nossos projetos. Quando desejamos algo e agimos de acordo com planos para alcançar o desejo, vamos nos meter em situações conflituosas. É inevitável. Nossos sonhos, por mais pacíficos e generosos, só podem se materializar quando superamos as resistências dos outros.

Mas é importante ver que “conflito” não significa apenas violência ou opressão. Estas são, na verdade, as maneiras mais obtusas de lidar com os confrontos presentes na vida de todos. A violência é fundamentalmente destrutiva, porque o lado vencedor é o que mais prejudica o outro, o que impõe maior desordem. Ganha quem perde menos, em batalhas nas quais todos perdem muito. Além disso, quando as coisas se decidem com violência não há a menor garantia de que a solução é a melhor. Trata-se apenas da solução imposta pelo grupo com maior habilidade para agir com violência. Não é caminho para justiça, mas um desvio que leva apenas para a desigualdade e a ignomínia.

O caminho real, factível hoje, é a democracia. Nela os conflitos continuam existindo, a sociedade continua tendo problemas para enfrentar e escolhas para fazer. No entanto, a discussão é aberta e as escolhas são feitas por meios muito menos destrutivos (negociação ou voto, por exemplo). A vitória é alcançada com menores perdas para todos. A sociedade se mantém, se reorganiza e fica pronta para lidar com outras demandas. Existe ao menos algum vínculo entre o método de escolha e a qualidade da decisão escolhida.

Neste momento de grande expectativa e de grande polarização entre os brasileiros, Martin Luther King pode ser uma inspiração. O título deste artigo é uma frase marcante do pastor, em seu sermão “Quando a paz é detestável”. A paz é detestável, segundo ele, quando imobiliza uma situação de injustiça. Ela é detestável quando se constrói às custas de vítimas caladas e afastadas do cenário social. Quando apenas um grupo se manifesta e ordena o mercado apenas para seu próprio proveito. Quando os direitos dos outros são retirados e a maioria vê piorarem suas condições de vida.

O sermão ainda hoje é fértil e sábio, ao nos lembrar que o caminho é importante porque nos leva a um lugar melhor. Nós, que defendemos a democracia, precisamos reafirmar sempre que ela não é apenas um método econômico e útil, muito embora seja também essas coisas. Ela é essencial na luta pelos direitos dos cidadãos. Porque os direitos não são construídos por mágica, o conteúdo das leis é feito com luta.

A verdadeira paz acontece numa sociedade justa, na qual a violência e a opressão tenham sido retiradas do horizonte político. A democracia é o melhor caminho para nos assegurar dos nossos direitos hoje, na atual circunstância em que o mundo se encontra. Ela é o meio pelo qual a maioria pode se organizar para conseguir tratamento razoável pelo Direito. Mas a tentação é grande e precisamos nos lembrar que no caminho para a justiça não existem atalhos, apenas desvios.

Luiz Marcello de Almeida Pereira é professor de Direito Constitucional, mestre egresso do Programa de Mestrado e Doutorado da Universidade de Marília – PPGD/UNIMAR. Para maiores informações, críticas ou sugestões, acesse www.lextra.com.br.


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