Colunista | ESSA SEMANA - Vinicio Carrilho Martinez

A sentença foi proferida pelo cientista político e pesquisador da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Luciano Da Ros, ao El País, em 19-06-2016. O país tem 17.000 magistrados, mas não a organicidade necessária a um poder de fato.

“Um dos efeitos desta enorme autonomia individual dos magistrados é que cada juiz decide da forma que entende e, desse modo, é impossível ter posições claras de como o Judiciário, institucionalmente, decide”.

O
 Supremo Tribunal Federal (STF) também não é uma corte, mas um apanhado de 11 juízes – na expressão do professor Conrado Hübner Mendes, da Universidade de São Paulo. Por sua vez, feitos políticos incógnitos, na atualidade, lembram as “forças ocultas” de outrora. O chamado “temor reverencial” é só o terror do poder?

Se ministros do STF antecipam votos – na corte maior da judicialização da política – e depois atenuam a ocorrência de crime de responsabilidade, isto não comprova a ilegitimidade do processo do impeachment, como Golpe de Estado[1]? Se mudarmos o voto, reconvertendo a consciência do julgamento, isto não esclarece a politização do Judiciário?

Além disso, o Judiciário brasileiro é o mais caro do mundo, com custos fixos e distribuição de privilégios chegamos a 1.3% do PIB. E quando observamos mais atentamente o processo de institucionalização de uma Ditadura Inconstitucional – que se projeta no impeachment, mas que decola na casta do Judiciário – aí, então, a questão ganha contornos inauditos à legalidade democrática aposta à CF/88.

Exemplo contundente está no fato de o jornal A Gazeta do Povo/PR já ter sofrido mais de 45 ações de magistrados incomodados com a divulgação de seus super-salários. Vencimentos muito acima do teto constitucional indicam privilégios que tem efeito de casta social. Sobretudo, se, na luta por manter os privilégios, o Judiciário se voltar contra a liberdade de imprensa.

Como se sabe – e como acentua Da Ros –, sem liberdade de imprensa e Judiciário independente, não há democracia, não há coisa pública. Sem este conjunto articulado, entre Princípio Democrático e República, o Estado de Direito não passa de um nódulo vazio e autocrático.

Neste caso, há que se remontar a atual Ditadura Inconstitucional aos efeitos históricos e pernósticos da autocracia como forma de governo, poder e sistema político. Neste país, sob os privilégios da casta, a autonomia (“dar normas a si”, participando de sua elaboração) se converteu em autocracia. Por isso, o Judiciário não admite auditoria: de audire, ouvir, transformou-se em perscrutar, investigar.

A conversão da autonomia em autocracia, como forma insólita de “governo de si” – ou “por si próprio” (autos) e tão ao gosto de “déspotas esclarecidos” –, é possível quando um grupo, casta ou classe social não se submete às mesmas regras de controle do poder abusivo.

Nesta conjunção fatal – autonomia transmutada em autocracia e imune à auditoria do poder – têm-se, simplesmente, que o poder de promulgar normas reguladoras (soberania democrática) é aprisionado por privilégios de casta social. Nisto que, talvez, esteja o âmago da Ditadura Inconstitucional, ao passo que ainda inspira a criação de mais um subtipo de Estado de Exceção.

Portanto, sem que o Judiciário receba o mesmo tratamento republicano que os demais poderes, Executivo e Legislativo, sem que suas contas, cotas e abusos sejam auditorados e submetidos em accountability, para apreciação pública, de fato, não será um poder genuíno, mas sim uma casta social com muito poder e capaz de atentar contra a soberania popular e a democracia.

Enfim, não há Poder Judiciário autônomo porque vigora uma Ditadura Inconstitucional.

Vinício Carrilho Martinez (Dr.)
Professor Ajunto IV da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar/CECH

Marcos Del Roio
Professor Titular de Ciências Políticas – UNESP/Marília

 

 



Giro Marília -ESSA SEMANA - Vinicio Carrilho Martinez
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Mais um professor que gosta de escrever. Na verdade, é uma compulsão, desde jovem. Também fiz pós-doutorado, três vezes, e doutorado na USP. Mas, o que gosto mesmo é de gatos(as), são bichos inteligentíssimos."

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