Colunista | ESSA SEMANA - Vinicio Carrilho Martinez

O vendaval que assolou uma parte do país e também Marília – levando o município a decretar Estado de Emergência – é um bom exemplo, apesar de trágico para milhares de famílias, para entendermos esse instituto do direito.

O suposto Estado de Emergência é regulamentado pelo Decreto Nº 7.257, de 4 de agosto de 2010, da Presidência da República.

Art. 2o  Para os efeitos deste Decreto, considera-se:

III - situação de emergência: situação anormal, provocada por desastres, causando danos e prejuízos que impliquem o comprometimento parcial da capacidade de resposta do poder público do ente atingido.

Em Marília, no entanto, devemos estabelecer duas situações bem distintas: a dengue e o vendaval.  A dengue foi utilizada, a meu ver, de modo oportunista. Porque é obrigação das autoridades cuidar da limpeza, capinação, educação do povo, além de recolher o lixo e promover a nebulização dos criadouros do mosquito. Ao contrário disso, vimos, por várias vezes, piscinas em área pública abandonadas e cheias de água – e, é obvio, infestadas de larvas do mosquito.

Então, se houve iniciativa, ela foi diminuta e, dentre outras, é por isso que há uma ação civil pública do Ministério Público Estadual, investigando a inércia e a incompetência no controle da doença que matou não se sabe quantas pessoas. Nos dois casos, a Defesa Civil deveria se consultada.

Esta anomalia jurídica – pois que não se dirige a situações de normalidade cotidiana – deveriam servir para proteger ou assegurar a sobrevivência das pessoas atingidas. Em ambos os casos, o governo federal será invocado para repatriar verbas ou aditivos de socorro emergencial.

Sem licitações, para ganhar tempo, o dinheiro público deveria minorar o sofrimento dos que perderam quase tudo. E aí começa outro problema, o da salus publica, uma vez que a saúde do erário já é comprometida havendo controle apertado, imagine com regras frouxas.

De qualquer forma, a dengue não foi provocada por “motivo de força maior”, como se viu no vendaval desta semana. A base legal não se coaduna com o exposto nas ações públicas municipais. Portanto, aplica-se o dispositivo tão-só no caso da chuva de granizo que, em alguns momentos, dado o calibre das pedras de gelo, parecia ser chuva de granito (como diz o caipira).

Note-se, por preciosismo, que o decreto não retrata um Estado de Emergência, empregando-se somente a expressão composta de “situação de emergência”; bem como prevê o “estado de calamidade pública”. Sendo a situação de emergência mais extensa e sem tempo determinado.

Propositalmente, o texto legal também não emprega Estado, em maiúsculo, para que não haja confusão com Estado de Sítio e Estado de Defesa – esses últimos são institutos propriamente políticos, voltados, por exemplo, à segurança das instituições públicas e à integridade nacional.

Porém, como os institutos da situação de emergência e da calamidade pública via de regra são manuseados pelo mesmo Poder Público que deu origem ao problema a ser debelado – por incapacidade, improbidade ou negligência –, o Decreto 7.257/2010 acaba tendo efeitos muito mais políticos do que socorristas e humanitários.

Quem não se lembra dos recursos que nunca chegaram à região serrana do Rio de Janeiro? Quem se esqueceu que as pessoas foram engolidas por toneladas de lama que descia das encostas, indevidamente ocupadas, e que não foram alertadas?

Assim, devido ao desvio conceitual e ao uso instrumental dos grupos de poder, emprego o termo correlato de situação de emergência; contudo, na forma específica de um verdadeiro Estado de Emergência Política. Porque, o que se quer, no fundo, não é cuidar das pessoas, mas sim zelar pelos interesses político-eleitorais ou ainda se livrar de ações criminais.

Pelo sim, pelo não, o Estado de Emergência não nos fará nenhum bem.
                     


Giro Marília -ESSA SEMANA - Vinicio Carrilho Martinez
ESSA SEMANA - Vinicio Carrilho Martinez
Mais um professor que gosta de escrever. Na verdade, é uma compulsão, desde jovem. Também fiz pós-doutorado, três vezes, e doutorado na USP. Mas, o que gosto mesmo é de gatos(as), são bichos inteligentíssimos."

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